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- Direito & Defesa do Consumidor -
01 de maio de 2006


SORTEIOS FRAUDADOS
Por Gladston Mamede, professor universitário e advogado - [email protected] 

            A concorrência ferrenha entre empresas por consumidores e, enfim, pelo mercado, nunca prescindiu de bons advogados, sabem-no bem os norte-americanos e europeus. Já nestas terras deitadas eternamente em berço esplêndido, ao som do mar e à luz do céu profundo, a utilidade dos causídicos ainda é subestimada. Coisa de economia incipiente, pouco competitiva. Mas é problema que vai se resolvendo aos poucos, a bem de todos.

            Do hemisfério norte, aqui mesmo na América, vem uma notícia curiosa que mostra como pode ser a expressão jurídica da competitividade entre grandes empresas. Em 2001, após investigações do FBI, um escândalo abalou o mercado norte-americano: descobriu-se que funcionários da Simon Marketing Inc., uma empresa de mercadologia (ou "marketing" para os manifestantes de "anglofilia"), especializada em brindes, jogos e outras promoções similares, teriam fraudado alguns sorteios com prêmios milionários. Entre os clientes da Simon Marketing estava a McDonald's: sorteios anunciados pela empresa de refeições rápidas tinham sido fraudados. É preciso deixar claro que não se comprovou qualquer participação da McDonald's nas fraudes praticadas pelos empregados da Simon Marketing Inc. Ainda assim, uma coisa é certa: milhares de consumidores concorreram a prêmios em sorteios dirigidos. Concorreram, mas não poderiam realmente ganhar.

            Agora, em 2005, essa história ganha um novo ingrediente bem curioso: a franqueadora da rede de lanchonetes Burger King, concorrente direta da McDonald's, ingressou com uma ação de indenização no Judiciário da Geórgia (EUA), baseada justamente na existência dessas fraudes nas promoções da rival, no período entre 1995 e 2001. O fundamento da ação é bem engenhoso: mesmo não sendo a McDonald's a responsável pelas fraudes – mas empregados da empresa que contratou para organizar suas promoções –, durante seis anos, ela se beneficiou de ações mercadológicas fraudulentas. Consumidores foram às lanchonetes da rede, atraídos por promoções que não sabiam fraudadas, deixando de freqüentar as lojas das concorrentes. A responsabilidade da empresa não estaria na participação na fraude; isso é irrelevante no caso. Sua responsabilidade derivaria do benefício comercial que teve com as promoções falsas, que foram organizadas por uma empresa que contratou.

            A Burger King, assim, quer ser indenizada pelos clientes que perdeu com as promoções fraudadas. Que tal? Afinal de contas, as lanchonetes de sua rede de franquia ("franchising", para os anglófilos) deixaram de vender seus sanduíches, refrigerantes e sei-lá-mais-o-quê para gente que preferiu ir comer no McDonald's, acreditando que poderia ganhar uma bolada, concorrendo aos jogos e sorteios que, fraudados, não os premiariam jamais. Os advogados da Burger King alegam que a propaganda enganosa lesa não apenas o consumidor, a vítima direta do engano, mas também os concorrentes, que são vitimados indiretamente. Genial!

            O mais divertido, no entanto, está por vir: a ação não pede apenas a indenização pelos clientes que foram perdidos no período em que se realizaram as promoções fraudadas. Os advogados ainda argumentam que, nesses seis anos, muitos consumidores, atraídos inicialmente pelas promoções, acabaram se tornando fiéis à rede McDonald's. Vale dizer: a rede estaria se beneficiando, até hoje, de sorteios que atraíram pessoas que acreditavam estar concorrendo, mas não estavam, em face da fraude. Claro! O grande mérito das promoções é "fidelizar" consumidores: vão atrás de prêmios e acabam criando o hábito de voltar. Isso sabem bem todos os mercadólogos, ou, preferindo, "marketeiros", senão "marqueteiros": da anglofilia para o neologismo anglicista. E como essa gente, "fidelizada" em promoções fraudadas, ainda está indo ao McDonald's, deixa de ir ao Burger King, ampliando os seus prejuízos e prolongando no tempo os efeitos do que seria uma concorrência desleal involuntária.

            Curiosamente, o Direito brasileiro tem normas e princípios que permitiriam uma tal solução. É preciso questionar, todavia, qual seria a resposta que o Judiciário daria a teses tão avançadas.


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