Área Cultural Área Técnica

 Ciência e Tecnologia  -  Colunistas  -  Cultura e Lazer
 
Educação  -  Esportes  -  Geografia  -  Serviços ao Usuário

 Aviação Comercial  -  Chat  -  Downloads  -  Economia
 
Medicina e Saúde  -  Mulher  -  Política  -  Reportagens

Página Principal

C  I  N  E  M  A
C R Í T I C A

0 1  /  A G O S T O  /  2 0 0 9
ATUALIZAÇÕES QUINZENAIS


TÚLIO SOUSA BORGES, Colunista de cinema do Portal Brasil - www.portalbrasil.net

ABAIXO DAS EXPECTATIVAS
De resto completamente diferentes, três novos filmes cumprem apenas em parte suas respectivas promessas

O Guerreiro Genghis Khan (Mongol, 2007), que chega com certo atraso ao Brasil, constitui por si só uma boa notícia. Ainda é possível filmar um épico sério, adulto, demonstra o célebre diretor russo Sergei Bodrov. Por não se inspirar em quadrinhos nem depender de ridículos efeitos especiais, seu filme é automaticamente superior aos exemplares do gênero que foram produzidos, em Hollywood ou alhures, nos últimos tempos. Mas compará-lo, como fizeram alguns críticos, a Lawrence d’Arábia (1962) e outros grandes clássicos não se justifica. Puro exagero! Reverente e imaginativo, O Guerreiro Genghis Khan até possui apurado senso visual do que era – e, nalguns casos, ainda é – a vida nas estepes, mas carece de semelhante competência no que concerne ao drama (os diálogos são ruins, e.g.) e ao espetáculo. Do contrário, seu sopro renovador seria completo. Deve ser julgado meramente razoável e instrutivo, no fim das contas. Teoricamente talhado para a grande tela – e exibido com algum sucesso em cinemas ao redor do mundo, figuraria melhor numa grade de programação televisiva.

*

            Responsável por clássicos modernos como Fogo contra fogo (Heat, 1995) e Colateral (2004), Michael Mann é um diretor cheio de estilo. Algumas vezes, porém, essa característica joga contra seus próprios filmes – como pode atestar quem tiver visto com olhos críticos o péssimo Caçador de Assassinos (Manhunter, 1986), primeira aparição de Dr. Hannibal Lecter no cinema, interpretado ali por Brian Cox.

            Quem não se empolgou quando do anúncio de que o novo filme de Mann contaria com um duelo entre Johnny Depp e Christian Bale? A trama de Inimigos públicos (2009) se passa em meados da década de 30, e trata, com liberdade artística, da guerra empreendida contra os gângsteres pelo recém-criado FBI. O agente Melvin Pervis (Bale) é encarregado de liderar a força que deverá prender ou eliminar o ladrão de bancos John Dillinger (Depp), tachado de ‘Inimigo Público nº 1’.

            Atrapalhado por um roteiro defeituoso e pelo próprio virtuosismo, Mann acabou fazendo, infelizmente, um de seus piores filmes, que sofre de alguns dos mesmos defeitos que haviam prejudicado Miami Vice (2006). O principal problema é o uso equivocado do formato digital. Além disso, houve desperdício de energia em seqüências muito longas. Como gostar de um filme que tem o visual errado e um ritmo narrativo ruim?

            Não obstante, Inimigos públicos tem certo poder. No meio de tanta bagunça – e mesmo que não esteja no mesmo patamar de O Homem que matou o facínora (The Man Who Shot Liberty Valance, 1962), o filme nos assombra com sua noção romântica do fim de uma era. Trata-se de uma apropriada ampliação da melancolia que, de modo curioso, sempre caracterizou a filmografia do diretor. Nossos projetos e amores estão condenados ao fracasso. Abraço-lhe agora, mas sinto que não poderei fazê-lo por muito tempo. O crepúsculo parece anunciar uma noite eterna. Será que verei o próximo nascer do sol?  

            Inimigos públicos mostra o raiar da era do controle racional na América. A modernidade chegou de vez, para bem ou para mal. Purvis e Dillinger, policial e criminoso, podem estar em lados opostos da lei, mas ambos são homens do passado. O primeiro é um aristocrata, um cavalheiro com admirável senso de justiça, atormentado por alguns dos métodos que precisa empregar. O outro é um pirata moderno, um corajoso dândi que gosta de viver intensamente. Mesmo quando se acredita invencível, parece saber, em seu inconsciente, que não tem futuro.

            Johnny Depp parece ter nascido para interpretar Dillinger e realiza seu trabalho com facilidade e brilho. Só não está melhor do que a excelente atriz francesa Marion Cotillard, sua namorada no filme. Sempre competente, mergulhando profundamente em seus papéis, Christian Bale nunca aparece mais do que o necessário. Acaba um tanto quanto ofuscado aqui, é verdade, mas também confere apropriada gravitas à sua personagem.             

            Segundo alguns críticos, Inimigos públicos seria inferior aos filmes de gângster dos anos 30 justamente por não possuir o senso moral que os orientara. Pura tolice! A produção erra, sim, em alguns comentários políticos – ao pintar um retrato distorcido de J. Edgar Hoover, por exemplo – e chega mesmo a se aproximar do niilismo. Mas diferentemente de seus confusos ancestrais, traça uma linha que separa homens e covardes com clareza. Em sua bela cena final, enaltece a decência de um velho homem da lei.

*

            A grande maioria dos filmes brasileiros costuma restringir-se a duas categorias: ou é comédia pastelão ou, mais comumente, trata de problemas sociais. Arte como espaço privilegiado da contemplação? ‘Coisa de burguês’, diriam alguns. Por essas e outras, a mera realização de um drama como À Deriva (2009) já é motivo de satisfação.

            A estória se desenrola em Búzios, nos anos 80, durante as férias de verão de uma família de classe média. Mathias (Vincent Cassel) – um escritor francês radicado no Brasil – e a esposa Clarice (Debora Bloch) estão passando por uma crise conjugal. O drama é visto através dos olhos da filha mais velha do casal, a adolescente Filipa (Laura Neiva, estreante descoberta no Orkut), que, por sua vez, está descobrindo a própria sexualidade.

            Material para um grande filme, não? Mas se a proposta é louvável, os resultados não passam de medíocres. Tudo é esquemático, inclusive as surpresas. Uma rosa mecânica, que desabrocha ao ser acionada por controle remoto.

            No epílogo, vemos uma sucessão de fotos que registram vários momentos na vida da família dos protagonistas. Dá o que pensar. Afinal, é preciso mais do que algumas boas idéias para que se justifique parar o tempo com uma câmera. O título do filme pode até fornecer uma metáfora interessante, mas À Deriva carece de um conceito visual mais preciso.

            O festejado diretor Heitor Dhalia (O Cheiro do ralo) demonstra razoável inteligência e talento na condução do clímax e do desenlace, mas não soube levar o filme até ali. Falta-lhe suficiente refinamento para manipular um jogo de sentimentos e olhares com a necessária sutileza e sensualidade. Os diálogos são péssimos e só as ótimas participações de Cassel e Bloch impedem a indiferença do espectador.

            A fita fica muito abaixo de uma de suas principais influências, o belíssimo Verão de 42 (1971), de Robert Mulligan. Sem pensar, é claro, no que o grande Valerio Zurlini teria feito com semelhante estória...

Por Túlio Sousa Borges, [email protected]

PROIBIDA REPRODUÇÃO SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA EXPRESSA
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AO PORTAL BRASIL
® E AO SEU AUTOR

Para ler colunas anteriores, Clique aqui


FALE CONOSCO ==> CLIQUE AQUI