Duas vezes Tornatore
Prêmios cinematográficos raramente dizem
respeito à excelência artística dos filmes.
Só o prestígio do diretor italiano Giuseppe
Tornatore, por exemplo, explica a indicação
de Baarìa (2009) ao Globo de
Ouro de Filme em Língua Estrangeira.
A
filmografia de Tornatore sempre apresentou
um sério defeito, já evidente no memorável
Cinema Paradiso (1988): seus filmes
são emocionalmente apelativos e
manipulativos, como se o diretor desejasse
nos comover a qualquer custo. Nesse aspecto,
ele se parece muito com o brasileiro Walter
Salles.
Se
às vezes o problema não chega a comprometer
o resultado final, isso não vale para
Baarìa. Em poucas palavras, o filme
é fracasso.
O
título é nada mais do que o nome, em gíria
regional, de Bagheria, cidade-natal de
Tornatore situada na província siciliana de
Palermo; e o filme narra, com pretensões
épicas, a estória de três gerações de uma
família humilde. Trata-se de um trabalho
bastante pessoal, sobre memórias e sonhos.
Tem alguns episódios genuinamente charmosos,
mas é kitsch no todo, tão falso
quanto a maquiagem que tenta envelhecer o
fraco ator principal. Se Tornatore tenta
imitar Fellini, Baarìa está
mais para Il Mulino Bianco (truque
publicitário criado pela marca de biscoitos
de mesmo nome e potencializado por meio de
comerciais televisivos assinados pela dupla
Tornatore/Morricone) do que para Amarcord
(1973) - clássico de Fellini sobre as
lembranças da infância em Rimini.
Apresentado em Brasília na V Semana Venezia
Cinema, Baaría arrancou
aplausos da platéia. Gosto de pensar que ela
estava agindo por educação...
*
Antes dessa bomba, Tornatore dirigiu um
filme muito melhor, o suspense/mistério
A Desconhecida (La sconosciuta,
2006). Disponível na melhores locadoras,
ele trata de uma misteriosa ucraniana que
chega à cidade de Velarchi, tornando-se
empregada dos Adacher, rico casal de
ourives. A moça tem segundas intenções, a
princípio obscuras, e tenta se aproximar
estranhamente da pequena filha do casal.
Num
filme repleto de surpresas, Tornatore cria
atmosfera semi-gótica a fim de narrar uma
estória bíblica de sofrimento e redenção,
retomando seu obsessivo interesse – já
manifestado em Malèna (2000) – pela
figura de Maria Madalena.
Os
tradicionais defeitos do diretor estão
presentes, mas não prejudicam muito a
produção. La sconosciuta é um
filme tenso, que prende como poucos a
atenção do espectador.
Por Túlio Sousa Borges,
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