O
desinformante
“É difícil
saber quando ele está dizendo verdade”.
Com esse eufemismo, o juiz descreve o réu na
cena do julgamento em O Desinformante
(The Informant, 2009), novo filme de
Steven Soderbergh. O magistrado poderia
muito bem estar se referindo ao atual
vice-presidente dos Estados Unidos, Joseph
Biden, que se acostumou a fazer afirmações
que não batem, por assim dizer, com a
realidade.
O comentário
depreciativo tinha outro alvo, porém: Mark
Whitacre (Matt Damon, em desempenho curioso
e competente), o protagonista da trama. Alto
executivo de uma grande corporação, Whitacre
passa a colaborar com o FBI, acusando sua
própria companhia de liderar um cartel
internacional. Aparentemente um herói
disposto a colocar sua própria carreira em
risco para desmascarar vilões corporativos,
ele acaba se revelando, gradativamente, um
mentiroso patológico, que – assim como os
patrões – também tem esquemas fraudulentos.
O caso de ajuste
de preços envolvendo a ADM (Archer-Daniels-Midland
Company) ocorreu em meados da década de 90.
Whitacre, hoje presidente de sua própria
firma, também existe. The Informant
baseou-se no livro do repórter investigativo
Kurt Eichenwald. O filme e sua fonte parecem
ser relativamente fiéis aos fatos, mas – por
se tratar de um caso essencialmente
controverso – não se sabe muito bem até que
ponto.
Ao
tratar dos anos 90, The Informant
também toma outras décadas como referência
em sua peculiar viagem no tempo. Pouco criativo, Soderbergh é mais um diretor contemporâneo
que busca soluções no cinema dos anos 70. Ao
mesmo tempo, demonstra inteligência ao
reviver o medo da invasão econômica
japonesa, o “perigo amarelo” que assombrava
a América nos anos 80. Além disso, há ecos
de escândalos corporativos mais recentes,
como o da Enron – que, coincidentemente,
também inspirou um livro de Kurt Eichenwald.
Soderbergh e
seus colaboradores seguiram um princípio
freqüentemente adotado por Kubrick. Em
alguns casos, a realidade é tão absurda que
o riso seria a única coisa que nos restaria.
Infelizmente, a opção só funciona até certo
ponto e parece insuficiente para justificar
um longa-metragem. The
Informant é
mais entediante do que engraçado; a ironia
se torna excessiva e a brincadeira acaba
indo longe demais.
Por Túlio Sousa Borges,
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