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16 / outubro / 2005
DIREITO
PROCESSUAL CIVIL
Como Ganhar Dinheiro com o Dano Moral
Dr. Marcos
Roberto de Araújo (*)
Quando ouvimos falar em dano moral, trazemos à memória algum
acontecimento que tenhamos vivenciado ou que compartilharam-nos
algum familiar ou conhecido. Assim, logo lembramos da situação
constrangedora da senhora que ficou retida na porta giratória do
banco, do menino que morreu sob as rodas de um carro assassino, do
sujeito que levou uma surra dentro do clube na presença da família
e amigos ou daquele outro que teve seu nome inserido indevidamente
no SPC. E convenhamos que se continuássemos rememorando as várias
situações cotidianas que dariam ensejo a responsabilidade por dano
moral, certamente não as esgotaríamos, dada a imensidão do campo
fático.
No entanto, é recente a aceitação da possibilidade de se
indenizar o dano puramente moral causado pela atuação de alguém
que, agindo intencionalmente ou com culpa, venha a causar um
"prejuízo moral". Doutrinariamente, a corrente dos que
negam a indenizabilidade do dano moral sustenta que não se pode
atribuir um valor pecuniário à violação moral, pois, isto sim,
seria uma imoralidade.
Prosseguindo-se na negativa, perguntar-se-ia: quanto custa a amputação
de uma perna, ou a vida do pai assassinado por policiais, ou, ainda,
a traição do marido com quem conviveu a esposa por vinte anos?
Ora, uma indenização a título de dano moral devida em razão
dessas ofensas não seria admissível, dada a impossibilidade de se
atribuir um valor a tais bens, diga-se, por serem bens inerentes a
cada ser humano como essência existencial. Vê-se, pois, que estão
arraigados em cada ser humano, em razão da própria existência,
por projeções valorativas pessoais ou pela ciência do aspecto
modelar humano a nós impingido pela convivência.
Não
obstante, superamos, recentemente, a idéia da não indenizabilidade
do dano puramente moral, o que foi aclarado pela normatização
constitucional que passou a abarcar a possibilidade da indenização
nessas circunstâncias. No entanto, não se pretendeu tornar possível
a atribuição de um correspectivo em pecúnia ao que, em tese, não
poderia ser reparado. Evoluímos para a aceitação da existência
do dano moral, desse "prejuízo" que não é experimentado
pelo patrimônio material da pessoa, mas por ela em si.
Assim, ao lado do patrimônio em sentido técnico, há um patrimônio
subjetivo, consistente nas aptidões físicas e psíquicas inerentes
a pessoa humana, aptidões que com ela nascem e que com ela se
findam. Destarte, a ocorrência do dano moral não deverá somente
ser analisada sob a ótica de atuação da conduta danosa, mas em
seus efeitos, embora cientes de que a causa violadora é externa,
perceptível, mas de efeitos latentes.
E
sendo assim, difícil será sua aferição e transcrição aos autos
de um processo que, excessivamente racional e técnico, exigirá
maior dimensão atuante para alcançar os olhos do juiz. Outrossim,
afirmamos que se o dano dito moral não emerge por si ou não
consegue apresentar-se palpável, dificilmente será indenizado, já
que o que a lei concede é a indenização pelo dano que emerge em
seus efeitos, transpondo o subjetivismo e alcançando dimensões de
paridade ao senso comum. Exemplificadamente, ninguém nega a dor da
mãe que viu o filho sair de casa com vida e o vê retornar sem ela,
por conduta imprudente de algum motorista, ou seja, indenizáveis são
as dores, males e irresignações internas que transcendem o
individualismo subjetivo e alcançam o íntimo de todo homem, numa
projeção de repulsa que faz este em relação a eventualidade do
dano ser impingido a si próprio.
Porquanto pacífico é o entendimento de que o dano moral para ser
indenizado deve ter uma dimensão avantajada, já que o simples incômodo,
o enfado, o desconforto, a irritação, sentimentos comuns na vida
cotidiana, corolário das relações sociais, não seriam indenizáveis.
Estamos a tratar de dano moral, como aquele que afronta direitos
integrantes da personalidade, mas capazes de transcenderem a simples
narração fática e o subjetivismo, hospedando-se no íntimo de
outros indivíduos estranhos ao dano. Melhor dizendo, o dano dito
moral tem efeitos em ambiente subjetivo, mas a necessária verificação
de sua ocorrência deverá pautar-se em critérios objetivos,
externos, posto ser impossível adentrar no íntimo do indivíduo
para lhe perquirir as dores, angústias e rancores.
Vê-se
que a verificação da ocorrência do dano moral é tarefa árdua
dada a quantidade de situações que podem ou não ensejar ofensa à
valores intrínsecos da pessoa e a dificuldade em sua prova. Por
outro lado, não faltará quem esteja disposto a transformar a
aceitação da indenizabilidade do dano moral em uma indústria das
indenizações milionárias, como ocorreu nos Estados Unidos.
Inúmeras são as ações judiciais em que se pleiteiam a indenização
por dano puramente moral, em sua maioria, infelizmente, encabeçadas
por pessoas interessadas em obter vantagens escusas em detrimento da
proteção outorgada pela norma, seja para sustentar numerários
exorbitantes, seja para afrontas, desprestígios ou captações
pessoais, sociais e, principalmente, eleitorais.
Por isso e com maior razão, é imprescindível uma rigorosa observância
do preenchimento dos pressupostos comuns e determinantes da
responsabilidade, sob pena de se desgastar o instituto da
responsabilidade civil e o prestígio já castigado do Poder Judiciário.
Se pretendem indenização, seja por dano material, seja por dano
moral, necessária será a demonstração cabal da ocorrência e
extensão do dano, da conduta humana ensejadora do dano e de sua
imputação subjetiva, bem como a existência da relação causal
entre a conduta humana contrária à lei e o dano suportado.
O
título deste artigo, embora sugestivo às manipulações judiciais
para fins inescrupulosos, teve o intuito de servir como alerta aos
pretensos contendores, operadores do direito e demais cidadãos, na
tentativa de se robustecer a importância do instituto da
responsabilidade civil, sem, no entanto, se desgarrar da sensatez
interpretativa que se pretendeu dar ao tão falado dano moral.
(*) Marcos Roberto de Araújo é bacharel em Direito e colunista da Revista Perfil.
MATÉRIA
PUBLICADA ORIGINALMENTE NO SITE www.jauinfo.com.br
A PROPRIEDADE INTELECTUAL DOS TEXTOS É DE SEU AUTOR
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