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- A N Á L I S E     J U R Í D I C A -
01 / janeiro / 2006


DIREITO AMBIENTAL
O direito dos homens a um meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado
Por Sergio Luis Mendonça Alves

"O conhecimento humano encerra-se dentro dos próprios limites do sujeito pensante e nada comunica de seguro sobre a natureza das coisas, nem sobre o próprio homem. Igualmente impossível é formular um conjunto de preceitos éticos com validez objetiva. Assim como as sensações nada descobrem dos objetos externos, também os valores, aparentemente inerentes às coisas, reduzem-se a reflexos do sujeito, e nada é bom ou mau 'em si'"

Marilena de Souza Chauí 1

            O pensamento de Marilena Chauí no epígrafe, voltado à obra de Montaigne, me fez recordar da imperdível obra de Ecléa Bosi quando cita, e sua obra reflete memória, o prefácio de Anatole France (Vida de Joana d"Arc): "...Para sentir o espírito de um tempo que já não existe, para fazer-se contemporâneo dos homens de outrora [...] a dificuldade não está tanto no que é preciso saber do que no que é preciso não saber mais. Se nós quisermos verdadeiramente viver no século XV, quantas coisas devermos esquecer: ciências, métodos, todas as conquistas que fazem de nós modernos! Devemos esquecer que a terra é redonda e que as estrelas são sóis, e não lâmpadas suspensas em uma abóbada de cristal, esquecer o sistema do mundo de Laplace para só crer na ciência de santo Tomás de Aquino, de Dante e daqueles cosmógrafos da Idade Média que nos ensinam a criação em sete dias e a fundação dos reinos pelo filho de Príamo, depois da destruição de Tróia, a Grande"2.

            Em matéria de preservação ambiental, e considerando sua natureza antropocêntrica, é evidente que não queremos viver de memórias, mas sim legar para as futuras gerações um meio ambiente sadio, ecologicamente equilibrado, como direito primaz do homem.

            Desenvolvimento humano, erradicação da pobreza, com preservação de recursos naturais - que hoje a ciência demonstra são finitos - são objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (CF, art. 3° e 225) e representam o cumprimento de um princípio de primeira grandeza: o de uma existência digna (CF, art. 1º, III), fundada no equilíbrio e conformação dos valores essenciais do trabalho e da livre iniciativa (CF, art. 1º), com garantia de condições mínimas através de um piso vital mínimo (CF art. 6º), como aponta Fiorillo3.

            Queiramos ou não, critiquemo-la ou a elogiemos, temos uma norma fundamental, assim entendida, na lição de Ferdinand Lassale, "...uma lei fundamental da nação; uma Constituição não é uma lei como as outras" [sic] e, para entendermos o que seria uma lei fundamental, faz aquele autor três afirmações essenciais:

"(...) que a Lei fundamental seja uma lei básica, mais do que as outras comuns, como indica seu próprio nome: 'fundamental'; que constitua - pois de outra forma não poderíamos chamá-la de fundamental - o verdadeiro fundamento das outras leis; isto é, a lei fundamental, se realmente pretende ser merecedora desse nome, deverá informar e engendrar as outras leis comuns originárias da mesma. A lei para sê-lo, deverá, pois, atuar e irradiar-se através das leis comuns do país; ...as coisas que têm um fundamento não o são por um capricho; existem porque necessariamente devem existir. O fundamento a que respondem não permite serem de outro modo . Somente as coisas que carecem de fundamento, que são as casuais e as fortuitas, podem ser como são ou mesmo de qualquer outra forma; as que possuem um fundamento, não . Elas se regem pela necessidade(...)".4

            Não é por outra razão que elevamos nesta Constituição, que tantos criticam, como direito fundamental do homem brasileiro, o direito fundamental a uma vida digna e saudável, o que implica na preservação dos bens ambientais para as presentes e as futuras gerações.

            Assim, como leciona Cançado Trindade, "...nenhum cidadão pode estar alheio à temática dos direitos humanos e do meio-ambiente, mormente os que vivem em países, como o Brasil, detentores dos mais atos índices de disparidades sociais do mundo, que levam à triste e inelutável convivência, e, seu quotidiano, com a insensibilidade e insensatez das classes dominantes, a injustiça institucionalizada e perpetuada, e a continuada dificuldade do meio social em identificar com discernimento e compreender os temas verdadeiramente primordiais que lhe dizem respeito, a requererem uma reflexão e ação com seriedade"5.

            Não sou monista6, mas dualista, que no expressar de Rizzatto Nunes considera "a ordem interna e a internacional com coexistência independente, valendo dizer que para que as normas internacionais possam valer na esfera interna é necessário que sofram um processo de recepção para transformar-se em normas jurídicas no sistema jurídico do Estado Brasileiro"[sic]7.

            Assim, embora a Constituição Federal reconheça que nas suas relações internacionais o Brasil deva se "reger pelo princípio da prevalência dos direitos humanos" (CF art.4°, II), é princípio fundamental da lei maior dos brasileiros, em seu território, aliás reconhecido pelos demais Estados-membros, a aplicação do princípio da soberania (CF art. 1º, I), ainda que hoje em dia, ao menos no mundo do ser, isto possa parecer anacrônico - no mundo do dever ser não o é.

            No entanto, híbrido o conteúdo da Constituição do Brasil de 1988 - social e liberal - previu o legislador constituinte originário, reproduzindo muitas vezes o texto literal de normas internacionais, exaustivamente, a proteção dos direitos e garantias individuais e coletivas, aplicando-se somente de maneira subsidiária a lei internacional (CF art. 5º, § 2º).

            Mas, em matéria de Direitos Humanos e Meio Ambiente, mesmo antes de invocarmos aspectos de interpretação do sistema jurídico vigente no Brasil, ouso invocar o direito à vida - vida humana e todas as outras formas - o mais fundamental dos seres humanos, do ponto de vista filosófico, cristão e também juridicamente (CF art. 5º "caput").

            A propósito do direito à vida, muito antes das convenções internacionais e seus tratados, seu reconhecimento é base fundamental da existência, como aponta o Magistério - aqui com o significado da autoridade de ensinar, ligada ao supremo pontificado da Igreja Católica - afirma "tratar-se de uma inviolabilidade que é o próprio reflexo de Deus; dela derivam, em particular, os princípios que devem guiar a transmissão da vida e impedir todo o perigo de manipulação genética"[sic]8, por exemplo.

            Por quaisquer ângulos que se observe o direito fundamental do homem à sadia qualidade de vida - físico, científico, religioso ou agnóstico, que segundo Thomas Henry Huxley (1825-1895), naturalista inglês, só admite os conhecimentos adquiridos pela razão evitando conclusão não demonstrada - o que importa é a defesa intransigente de todas as formas de vida, com prevalência à vida humana, positivando-o na norma jurídica como direito do homem e "per se", dada à interação do homem com seu meio, nele incluído o construído (meio ambiente artificial).

BIBLIOGRAFIA:

1 In: MONTAIGNE, Michel de. Ensaios. Tradução de Sergio Milliet. São Paulo: Editora Nova Cultural, 2000, p. 16.];

2 BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças dos velhos. 3ª ed. - São Paulo: Companhia das Letras, 1994, p. 58-59;

3 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental. 3ª ed. Ampl.- São Paulo: Saraiva, 2002, p. 54;

4 LASSALE, Ferdinand. A Essência da Constituição. 4ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 1998;

5 TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Direitos Humanos e Meio-Ambiente: paralelo dos sistemas de proteção internacional. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1993, p. 24;

6 "Os monistas afirmam que o tratado internacional ingressa de imediato na ordem jurídica interna do Estado contratante. Subdivide-se entre aqueles que afirmam a supremacia do tratado internacional em face do direito interno e o que afirma valer o direito interno em caso de conflito";

7 NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor:direito material (arts. 1º a 54)- São Paulo: Saraiva, 2000, p. 12-13;

8 FILIBECK, Giorgio. Direitos do Homem - de João XXIII a João Paulo II. Tradução de P. João Seabra e Isabel Almeida e Brito. Cascais: Principia, 2000, p. 531.


MATÉRIA PUBLICADA ORIGINALMENTE NO SIT
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