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C  I  N  E  M  A
C R Í T I C A

1 6  /  S E T E M B R O  /  2 0 0 9
ATUALIZAÇÕES QUINZENAIS


TÚLIO SOUSA BORGES, Colunista de cinema do Portal Brasil - www.portalbrasil.net

Número errado 

            A tecnologia costuma ser uma faca de dois gumes. Confere-nos poder, mas quase nunca a sabedoria necessária para utilizá-lo. Quando não provoca preguiça intelectual. Existe hoje uma infinidade de canais de comunicação. E não escrevemos cartas, mas scraps.

            No caso de Hollywood, a excessiva – e estúpida – importância dos efeitos especiais tem, há algum tempo, destruído aquele delicado equilíbrio entre arte e indústria que caracterizara o auge do cinema comercial na Era Dourada. É cada vez mais freqüente entre os espectadores a tola crença de que quanto mais novo o filme, melhor. Como se Gladiador (2000) pudesse chegar aos pés de Ben-Hur (1959). Ou como se a refilmagem de O Dia em que a Terra parou merecesse respeito.

            Por outro lado, muitos avanços tecnológicos beneficiaram o cinema clássico. Tanto o DVD quanto a Internet permitiram o resgate de pérolas esquecidas da sétima arte. (Ainda não pude conferir The Searchers em Blu-ray, mas me garantiram que o épico de John Ford ficou mais magnífico do que já era.)

            Inexplicavelmente, passaram-se muitos anos antes que Pacto de sangue (Double Indemnity, 1944) chegasse em DVD ao Brasil – lançado pela Versátil no segundo semestre de 2007.  De todo modo, uma das melhores coisas a respeito do cinema noir é o fato de que sempre existe um novo filme a descobrir, dos grandes clássicos aos mais obscuros.

            Coincidentemente, as distribuidoras brasileiras parecem ter se esquecido de outro célebre noir dos anos 40 também produzido pela Paramount e estrelado por Barbara Stanwyck – indiscutivelmente, a primeira-dama do gênero. Trata-se de Uma vida por um fio (Sorry, Wrong Number, 1948).

            Pude vê-lo esses dias no TCM (Turner Classic Movies), canal que exibe séries e filmes antigos na TV por assinatura. O suspense, dirigido por Anatole Litvak (que também assina o excelente filme de guerra Decision Before Dawn, 1951), é a adaptação cinematográfica de uma peça radiofônica de extremo sucesso escrita por Lucille Fletcher – que também assina o roteiro do filme. No rádio, a protagonista foi encarnada por Agnes Moorehead e o terror que ela vive era potencializado pelo som.

            Muito mais longo do que a peça, o filme modificou algumas coisas, mas mantém o cerne da trama. Leona Stevenson (Stanwyck) é uma mulher rica e arrogante; confinada por uma doença cardíaca à cadeira de rodas, quase não se levanta da cama. Anoitece em New York e ela está sozinha em sua imensa mansão, irritada porque o marido (Burt Lancaster) ainda não retornou do trabalho. Somente o telefone a liga ao mundo de fora e Leona tenta, sem sucesso, discar para o escritório do marido. Quando finalmente parece conseguir, acaba ouvindo outra ligação, na qual dois bandidos planejam o assassinato de uma mulher. O crime será cometido na mesma cidade dentro de algumas horas. Leona avisa a polícia do plano maligno, mas passa aos poucos a suspeitar que a vítima seja ela mesma.

            A maior parte dos diálogos é travada por telefone e a narrativa emprega flashbacks para reconstituir o passado, remoto e recente. O resultado é um filme poderosíssimo, muito intrigante, claustrofóbico. Eis um noir particularmente escuro, no qual a noite parece eterna! As falas e imagens descortinam um mundo de egoísmo e maldade. A paisagem é marcada pela desilusão, revelando sonhos despedaçados. Não resta esperança aqui. Deveríamos ter mantido o título original no Brasil. Lamento, número errado sintetiza muito bem o clima do filme. Essa é basicamente uma estória de projetos fracassados.

            Stanwyck, conhecida como ‘a melhor atriz que jamais ganhou um Oscar’ (recebeu um prêmio honorário em 1982), foi indicada como Melhor Atriz por seu magnífico desempenho no filme. Lancaster, por sua vez, não parece muito à vontade, mas acaba, por isso mesmo, se encaixando perfeitamente no papel de um fraco, projetando a frustração da personagem. Na verdade, todos os elementos do filme se encaixam muito bem. A trilha sonora, composta pelo talentoso, mas limitado Franz Waxman, é muito eficiente. Tudo combina, finalmente, num clímax inesquecível. Quando a última frase é dita, as palavras carregam o peso do mundo.

            Não sei se a Paramount Brasil está interessada em lançar o filme. Bem que a Versátil, que lançou Pacto de Sangue sob licença da Universal, poderia pensar nisso. Entrementes, o leitor pode tentar conseguir a versão importada. Terá, de qualquer modo, um ótimo divertimento.

Por Túlio Sousa Borges, [email protected]

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